Imagine você indo para a cama dormir com plena certeza de que, na manhã seguinte, alguém terá chegado de muito longe especialmente para lhe entregar a realização de um sonho que você acalentou no decorrer de um ano inteiro. Um presente, é verdade, mas para o qual você se empenhou muito para se fazer merecedor. Finalmente a concretização virá coroando suas boas escolhas, seu nobre comportamento na sociedade e seus deveres de cidadão exemplarmente cumpridos. É a hora da recompensa! A noite parecerá longa, embalada por uma mistura de ansiedade e alegria antecipada.
Assim funciona a figura daquele velhinho de barbas brancas e roupas vermelhas no imaginário infantil na noite de Natal. Ele ocupa a mente das crianças numa faixa etária em que o senso de justiça, embora existente, ainda não é tão crítico assim. O espaço para comparações e julgamentos (uns ganham presentes tão caros, outros tão modestos) parece facilmente ocupado por imensa gratidão a alguém que veio de tão longe, sobrevoando montanhas para trazer alegria e fazer a festa.
Há várias interpretações sobre a crença em Papai Noel. Há quem afirme que a lenda desvia os olhares do original sentido cristão do Natal, credita ao mito méritos que são da família e semeia uma desnecessária desilusão futura. Há também quem alegue ter sobrevivido à lenda sem perdas e danos e mantém para os filhos a tradição do Pólo Norte.
A hora da verdade
Li uma teoria afirmando que, por volta dos dez anos de idade, a criança provavelmente terá descoberto por si mesma e sem grandes decepções a "inexistência" do bom velhinho. E caso isso não tenha ocorrido, será literalmente, a hora da verdade, com iniciativa da família.
Particularmente, me vi entre a cruz e a espada. Não queria que meu filho acreditasse em Papai Noel. Achava a concorrência desleal. Eu e minha família garantíamos o presente, e outro levaria a fama? Também acreditava que Papai Noel deveria dar melhor exemplo: ser vegetariano (com aquela barriguinha, acho que não é), fashion e manter a barba feita. Também poderia fazer caminhada para combater a tão temida obesidade. Ao invés disso, ele obriga as renas a voarem carregando seu peso? Definitivamente, Papai Noel deveria é ser protetor de animais, isso sim! Com todos esses argumentos com base em teoria nenhuma, decidi com meu marido que Fellipe não acreditaria nessa lenda.
Porém, fotos de crianças ao lado do bom velhinho ficam lindas! E o sorriso deles ao receberem o presente dado por aquele simpático senhor? Antes disso, escrever cartinha pedindo presente faz o coração de qualquer pimpolho bater mais forte. Não seria justo privar meu filho daquele mundo mágico... Então decidimos. Ele vai participar de tudo isso, ciente de que está participando de um conto de Natal, como se fosse uma peça de teatro. Afinal, o protagonista faz a criança acreditar em seus sonhos e se empenhar para ser merecedora das realizações. Quando bem conduzida, essa questão é muito nobre e educativa.
Ilusão ou encanto natalino?
Fizemos assim: meu marido alugou uma roupa de Papai Noel e chegou em casa "fantasiado" e trazendo os presentes. Com ajuda do vovô e da vovó, Fellipe atendeu à campainha e deu as boas vindas ao visitante. A timidez inicial logo deu lugar a um bate-papo descontraído. No meio da conversa, Papai Noel explicou que vinha de um lugar muito frio e passava por lugares altos até chegar em nosso país tropical. Por isso usava agasalho, mas estava sentindo muito calor. Pediu licença para tirar o casaco. Eu sugeri que meu filho ajudasse o amigo a tirar também o gorro (a barba viria junto por tabela).
Confesso que se pudesse, voltaria atrás naquele momento. Estava simplesmente tirando definitivamente do meu filho toda e qualquer ilusão natalina. E se estivesse também tirando seus sonhos de Natal? Quem garante que daquela idade, ele reaprenderia a sonhar? Felizmente, não deu tempo para me torturar mais. Despertei de meus questionamentos com um sorriso lindo de meu filho, que em breve se transformou em risada e evoluiu para gargalhada. Com o gorro e a barba do bom velhinho na mão, ele parecia estar diante da descoberta mais feliz do mundo e gritava com alegria: "É o papai, é o papai!"E completou surpreendentemente: "obrigado papai por você se vestir de Papai Noel e trazer presente". Conversa vai, conversa vem, Fellipe comentou o seguinte: "Todo mundo pensou que era o Papai Noel de verdade, e eu descobri que era o papai".
Tentamos contra argumentar: "mas este é o Papai Noel de verdade. O seu pai!" E ouvimos dele o seguinte: "Não! Para ser Papai Noel de verdade, ele precisa estar de casaco, com aquela barba e o gorro que ele tirou. Veste de novo, papai!" De fato, Papai Noel existe no momento em que usa roupas vermelhas, mantém a barba branca e comprida modelando o rosto rechonchudo, colorindo a infância e encenando sonhos no imaginário de nossos pimpolhos.
Meu filhote de três anos me convenceu: Papai Noel existe!
Feliz Natal!